Nephilins – O começo

Capitulo I

“E não é de admirar, pois que o próprio Satanás se transforma em anjo de luz.”
Paulo, o apóstolo, aos Coríntios, II, 11:14

Depois da criação do mundo e dos animais, Deus em sua sabedoria, tendo decidido criar o homem, pediu o conselho de todos a seu redor antes de levar a cabo seu propósito. Os anjos não estavam todos de acordo. O anjo do Amor era a favor da criação do homem, porque ele seria afetuoso e amoroso, mas o anjo da Verdade se opunha, porque ele seria cheio de mentiras. E, embora o anjo da Justiça fosse a favor, porque ele praticaria a justiça, o anjo da Paz se opunha, porque ele seria contencioso.
Quando finalmente o assentimento dos anjos foi dado à criação do homem, Deus disse a Gabriel:
– Vá e me traga poeira dos quatro cantos da terra. Criarei o homem a partir dela.
A poeira era, além disso, de várias cores: vermelha, negra, branca e verde – vermelha para o sangue, negra para as entranhas, branca para os ossos e veias e verde para a pele pálida.
Quando estava para colocar a alma no corpo argiloso de Adão, Deus disse:
– Soprarei a alma em suas narinas: da mesma forma que elas discernem o que é impuro e rejeitam-no, recebendo de bom grado o que é perfumado.
As extraordinárias qualidades com que Adão foi abençoado, tanto físicas quanto espirituais, suscitaram a inveja dos anjos. Esses tentaram consumi-lo com fogo, e ele teria perecido, não tivesse a mão protetora de Deus se estendido sobre ele, e estabelecido à paz entre ele e os exércitos celestiais.
Satanás, em particular, tinha ciúme do primeiro homem, e seus maus pensamentos levaram por fim à sua queda. Depois de ter dotado Adão de alma, Deus convidara todos os anjos para virem e prestarem-lhe reverência e homenagem. Satanás, o mais insígne anjo do céu, dotado de doze asas ao invés das seis de todos os outros, recusara-se a obedecer à ordem de Deus, dizendo:
– Criaste a nós, os anjos, a partir do esplendor da Shekiná, e agora ordenas que nos prostremos diante da criatura que moldaste do pó da terra!
Deus respondeu:
– Todavia o pó da terra exibe mais sabedoria e entendimento do que você.
Satanás exigiu uma prova de inteligência com Adão, e Deus assentiu, dizendo:
– Criei animais selvagens, pássaros e répteis. Tra-los-ei a todos diante de você e de Adão. Se você for capaz de dar nomes a eles, mandarei que Adão lhe preste homenagem, e você habitará junto à Shekiná da minha glória. Caso contrário, no entanto, se Adão chamá-los pelos nomes que designei a eles, você se sujeitará a Adão, e ele terá um lugar no meu jardim, e o cultivará.
Assim disse Deus e dirigiu-se ao Paraíso, seguido por Satanás.
Satanás tentou então atribuir nomes aos animais, tendo fracassado nas duas primeiras tentativas, o touro e a vaca. Deus conduziu dois outros animais até diante dele, o camelo e o jumento, com o mesmo resultado. Deus voltou-se então para Adão, e questionou-lhe a respeito dos nomes dos mesmos animais, construindo suas perguntas de modo a que a primeira letra da primeira palavra fosse a primeira letra do nome do animal posto diante dele. Desta forma Adão foi capaz de adivinhar os nomes corretamente, e Satanás viu-se forçado a reconhecer a superioridade do primeiro homem. Ele, porém irrompeu em clamores bárbaros que atingiram o céu, recusando-se a prestar homenagem a Adão como lhe havia sido ordenado.
O exército de anjos comandado por Satanás agiu da mesma forma, a despeito dos protestos de Miguel, que foi o primeiro a prostrar-se diante de Adão a fim de dar exemplo aos outros anjos. Miguel dirigiu-se a Satanás:
– Preste adoração à imagem de Deus! Se você se recusar, o Senhor Deus lançar-se-á em cólera contra você.
Satanás retrucou:
– Se ele se lançar em cólera contra mim, exaltarei meu trono acima das estrelas de Deus, e serei como o Altíssimo!
Imediatamente Deus lançou Satanás e seu exército para fora do céu sobre a terra, e é daquele momento que data a inimizade entre Satanás e o homem.
A decisão divina de conceder uma companheira a Adão veio ao encontro dos anseios do homem, que havia sido tomado por uma sensação de isolamento quando os animais vieram até ele em pares para receberem seus nomes.
A fim de banir sua solidão, a primeira mulher dada como esposa a Adão foi Lilith. Como ele, Lilith foi criada do pó da terra; ela, porém permaneceu com ele por um intervalo muito curto, porque insistia em desfrutar de igualdade completa com seu marido. Ela justificava seus direitos a partir de sua origem comum. Com a ajuda do Nome Inefável, que ela proferiu, Lilith fugiu de Adão e desapareceu em pleno ar. Adão veio reclamar diante de Deus que a mulher que ele lhe havia dado, o havia abandonado, e Deus enviou três anjos para capturá-la. Esses foram encontrá-la no Mar Vermelho, e tentaram fazê-la voltar com a ameaça de que caso não fosse ela perderia diariamente cem de seus filhos. Lilith, no entanto, preferiu essa punição a viver com Adão. Ela se vinga ferindo crianças de colo. O único modo de afastar o mal é colocando nas crianças um amuleto que traz os nomes de seus três anjos captores, pois esse foi o acordo feito entre eles.
A mulher destinada a ser a verdadeira companheira do homem foi tomada do corpo de Adão, pois “apenas quando semelhante é unido a semelhante à união é indissolúvel”. A criação da mulher a partir do homem foi possível porque Adão tinha originalmente duas faces, que foram separadas com o nascimento de Eva.
Adão foi levado a cair num sono profundo antes que a costela para Eva fosse retirada do seu lado. Isso porque se ele tivesse observado a sua criação ela não teria despertado amor nele. De fato, Deus havia criado uma mulher para Adão antes de Eva, mas ele a rejeitou, porque ela havia sido feita na frente dele. Conhecendo todos os detalhes de sua formação ele sentiu repulsa por ela. Porém quando despertou de seu sono profundo e viu Eva diante dele em toda sua surpreendente beleza e graça, ele exclamou:
– Esta é aquela que levava meu coração a palpitar por inúmeras noites!
O casamento do primeiro casal foi celebrado com pompa jamais repetida no curso de toda história. Assim sendo, os anjos cercaram o pálio matrimonial e Deus proferiu as bençãos sobre o casal.
O Paraíso sendo o que era Adão não tinha, naturalmente, que trabalhar na terra. É verdade que Deus colocou o homem no Jardim do Éden para tratar dele e mantê-lo, mas isso significava apenas que ele deveria estudar ali a Torá e guardar os mandamentos de Deus.
Embora não lhe fosse permitido matar animais para satisfazer o seu apetite, os anjos traziam-lhe carne e vinho, servindo-o como criados. E da mesma forma que ministravam-lhes os anjos de acordo com suas necessidades, faziam os animais. Esses encontravam-se inteiramente debaixo do seu domínio, e recebiam sua comida das mãos de Adão e de Eva.

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